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domingo, novembro 05, 2017

Museo de Málaga e Eu


Um único Museu com duas colecções, as colecções de arqueologia e arte do Museo de Málaga, expostas no El Palacio de la Duana.

Os Museus, as obsessões, o acertado de Fernando Pessoa, o destino e as escolhas que fazemos a cada infinitésimo de tempo.
As decisões sobre a direcção do olhar, podem não ser sempre nossas e muitos menos as mais assertivas, mas no interrogatório ao Universo ele responde com mais ou menos luz ambiente, menos ou mais silêncio e com palavras graves ou agudas consoante a disposição do receptor.
Em instantes mais ou menos mensuráveis, as ferramentas com que hoje buscamos iludir a ignorância, aportam-nos muito mais folhagem do que caules carnudos, porque as respostas vêm envoltas em algoritmos em vez de embrulhadas cuidadosamente em papeis de prata por dedos finos de damas com tranças compridas.
Foi difícil acreditar através de imagens nas respostas que o motor de busca da google me deu para uma questão tão “simples” – Teares Neolíticos. Não sei quantos dias, meses, anos, demoraria a descer e a subir pelas cadeias de lianas que me foram propostas, mas passados alguns minutos já estava “satisfeito” com a confusão instalada, e saí. Mas, saí com uma estranha sensação de “dever” cumprido perante o Universo, pois algumas imagens hoje universais guardadas desordenadamente na nuvem nasceram do meu olhar sobre tantos e diversos materiais, e foram colocadas por mim naquele cantinho da web, sabe-se lá por quanto tempo.
Com uma pesquisa alargada até à nuvem, procurava dados para dar coesão a um pequeno texto sobre teares neolíticos, depois de ter visitado um Museu Arqueológico no Sudoeste, acabado de estrear. Cada vez que se abre uma nova vitrine com pré-história “recente”, não desabam apenas interrogações, pois surgem oportunidades, fruto da tal luz ambiente do Universo, para confrontar registos mentais, já mais ou menos bem arquivados, com as traduções sensoriais de um artefacto que surge iluminado e legendado ao alcance da vista, embora longe pela sua não apreciação mais profunda através do toque.
Os registos digitais possíveis mais importantes para reflexão sobre a actvidade têxtil apresentados no Museu foram os seguintes:
 


 


Deste encontro, resultaram duas consequências relevantes. Por um lado, uma nova “proposta” para um tear neolítico e daí o reforço à impossibilidade de concordâncias nas diferentes abordagens à estrutura dos mesmos conhecidas até agora, e por outro uma nova interpretação à forma de alguns “pesos de tear”.
A imagem de um tear apresentada no Museu de Málaga é muito imaginativa, (competindo com o Museu de Serpa…),
 

 
 
 

já que propõe que na extremidade inferior de cada fio da trama um fragmento de “crescente” servindo de peso, e está associada a um montículo de “crescentes” incompletos com proveniência do “assentiamento del cortijo zapata”. Não parece existir na web informação clara sobre este sítio e as escavações que terão permitido recolher aquele espólio, e pela observação dos crescentes expostos fiquei perante um novo conjunto onde não me parece existir desgaste “vertical” consequente da fricção do fio de cada lado dos orifícios de suspensão, um dos factores físicos que entendo primordial para se tentar entender, e discutir, a função dos crescentes. Este conjunto exposto no Museu é morfologicamente coerente com idênticos materiais de vários locais do Sudoeste que observei ou tacteei, e portanto solidificante na cartografia das ocupações entre o Neolítico Final e o Calcolítico.
Na imagem seguinte, nos crescentes 228 e 230, é bem visível o resultado da furação no barro mole, com a auréola saliente na parede do lado de saída do instrumento usado para fazer o furo, e uma ligeira concavidade no lado oposto. Em ambos os casos, os orifícios mostram um desgaste quase simétrico, ligeiramente maior até no sentido de “ baixo para cima” se imaginarmos o crescente suspenso por dois fios, o que contradita o resultado no orifício provocado apenas que seja pelo próprio peso. Esta discussão, conduz à necessidade de uma construção experimental, baseada em inumeráveis interrogações sobre a paisagem e o modus vivendi das populações neo/calcolíticas, embora alguns dos indícios materiais dos processos de fiação tenham caminhado até à contemporaneidade como é o caso dos cossoiros.
 
 
Quanto às duas “pesas com forma de media luna”, com secção circular e furação perpendicular ao eixo maior, elas vêm acrescentar um sítio, mal identificado ainda, já que não conseguimos aceder a registos detalhados, a outros sítios onde apareceram este tipo de artefactos que fazem parte da longa lista dos achados “mudos”, e começar por classificá-los ou distingui-los através da sua forma aparente é uma abordagem positiva.
 
 

Há dois fragmentos de peso de tear achados em S.Brás3, com uma forma que encaixa nesta “media luna” (704 e 714 na imagem abaixo) mas estando incompletos fica sempre a impossibilidade de reconstituição e a dúvida sobre a sua dimensão inicial e consequentemente sobre a sua mera funcionalidade como parte da cadeia têxtil, ou com uma carga simbólica adicional, com que já havia sido confrontado perante a descoberta de peças semelhantes expostos nos Museus de Córdova e de Carmona, mais tarde com uma publicação de Georges Bonsor, e recentemente com um completo exposto recentemente no Museu de Serpa. No que respeita aos materiais publicados por Georges Bonsor, provenientes de Campo Real nos arredores de Carmona, e conservados na sua casa em Alcolea del Asnar, nos arredores de Sevilha, tive acesso à sua observação e fotografias na vitrine onde estão expostos, e a seguir podem-se observar as “pesas com forma de media luna”, e comparar a identidade com os acima referidos.
 





Acabar esta simples “notícia” arqueológica sobre Teares pré-históricos, embrulhada na “peça do mês”, com uma conclusão por mais curta e irrelevante que fosse, não podia deixar de ser uma tarefa impossível. De facto, em ambiente habitacional in sitú, nunca foi encontrado e “desmontado” um conjunto significativo de crescentes, que pudesse, em paralelo com o estudo deposicional antropológico, concorrer para uma proposta que acordasse para sempre a mudez dos crescentes. Por tudo o que antecede, decidi congelar estas linhas.
Como a dimensão do Mundo vê acrescentado conhecimento a cada hora, e estas linhas não objectivam uma tese sobre os teares pré-históricos, ficam por agora “descongeladas” como um capítulo e contributo para reflexão partilhada, tendo ainda em conta mais duas propostas de representação museológica. 
 

Museu de Latenium ( Lausanne)
 
 
 


Museu do Megalitismo (Mora)
 

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